Sonia Lins

É filha de Jair Lins, filho do primeiro casamento do velho Edmundo Lins. Ou seja, o pai dela era meio-irmão do pai de JLML, Edmundo Lins Jr., filho do segundo casamento de Edmundo. Jair Lins, severíssimo, era o segundo irmão mais velho  da família e tinha autoridade de pai sobre os outros irmãos, inclusive sobre Edmundo.

– Lembranças curiosas sobre Edmundo Lins, o patriarca

1) O Dr. Edmundo contava que a mãe dele – que tinha ficado viúva muito cedo – mandava ele entregar as roupas que ela lavava e passava aos clientes da vizinhança. Ele estudou num convento e foi treinado para ser padre, mas descobriu a tempo que não tinha vocação.

2) Dr. Edmundo passava dois meses por ano na casa de Jair Lins, que tinha ar-condicionado, um luxo no verão dos anos 50/60. Nestas estadas, ele se mostrava absolutamente diferente do Presidente do Supremo Tribunal Federal. No apartamento da Rua Farani, 52, ele se divertia com as crianças. Uma das brincadeiras dele: desarrumar os armários da Beatriz e dizer que foi Sonia, a Soninha, quem fez a bagunça. A briga entre as irmãs começava e ele se divertia.// Quando Jair, sempre sisudo e severíssimo  – ele costumava dizer aos filhos “sai do meu caminho” quando chegava em casa – , ia para o trabalho, o velho Edmundo avisava às crianças: “Saiu o cara de fumaça, vamos botar música”. Jair proibia música durante a semana (queria que todos estudassem, lessem e não perdessem tempo cantando e dançando pela casa) e a criançada, com o aval do avô, fazia a festa ao som de músicas de Carnaval, as preferidas dele. O velho Edmundo se sentava numa cadeira e, em posição de Buda, organizava o caos: “Vamos dançar”.

3) O banho – Dr. Edmundo enchia a banheira de água fervendo e derramava na banheira 250 gramas de bicarbonato de sódio. Em seguida, entrava na banheira com uma espécie de rosário e, a cada conta, recitava em voz alta de cor, estrofes inteiras da “Divina Comédia”, poemas de Camões ou textos de Ovídio. Quando saía do banho, seus dedos estavam murchos.

4) Adorava usar um pijama listrado, sempre muito limpo. A avó, D. Loló, fazia mingau para ele e preparava rosquinhas especiais.

5) Adorava jogar paciência na cama depois do almoço e do jantar e tratava os netos com muito carinho. Os filhos de Alcides Lins, que moravam perto, se reuniam com os filhos de Jair na casa onde Dr. Edmundo ficava hospedado, e era a maior confusão. Dr. Edmundo dava “carona” às crianças nas costas dele.

6) Uma história contada por Evandro Lins e Silva, colega de Supremo Tribunal: “ Como todo homem público, o velho Edmundo Lins tinha inimigos e, em algumas votações, teve que enfrentar pessoas de quem não gostava. Uma vez, ao dar um parecer que coincidia com o de um desafeto, ele iniciou o discurso da seguinte maneira: “Lamento concordar com Vossa Excelência.”

7) Era muito metódico. A mesa tinha que ser colocada na hora exata, em ponto. Ele tinha a mania de morder o bigode e de morder a mão quando estava nervoso.

8) Uma das frases dele: “Cumpri minha missão. Paguei os estudos de todos os filhos e tratei os dentes de todos.”

– Sobre Edmundo Lins, o filho: “era o mais dedicado dos irmãos”, o que tinha o “melhor coração”. Ela se lembra de que ele saía do emprego na Leopoldina e ia dar banho no avô todos os dias, quando o velho Edmundo Lins já estava doente. Os irmãos comentavam: “É o melhor de nós.” Ela se lembra de que ele era muito bonito e tinha um apelido: “gato”.

– Sobre Juca Pinto – personalidade muito conhecida em Arcos. Fazia charque na cidade e o pai dela comprava a carne em quantidade. Era barato e as crianças sofriam. “ Certa ocasião, o charque apodreceu. Foi uma alegria.”

– Sobre todos os Lins – são francos, são irritados, são obstinados.

– Sobre o primo JLML –  é o auge da obstinação, cabeça magistral, memória prodigiosa, ele tem um antídoto poderoso: ignora as pessoas que tenham traído a confiança dele. “Ringo não perdoa”, ela brinca. Sonia é dez anos  mais velha do que JLML e se lembra dele ainda menino. Com  9 anos, era bonito e ela já percebia uma força nele. Quando começou a ficar adolescente, ele via os primos estudando, entrando na universidade e perguntava: “O que você vai fazer?” Um respondeu: “engenharia”. JLML ia além: “ Qual é o salário?”. Diante da resposta, ele concluía: “ É pouco para mim”. Fazia as mesmas perguntas a todos e quando ouvia a resposta (“médico”, “dentista”, “advogado”) dava a resposta de sempre: “É pouco para mim.”// Ele separa  bem as coisas dentro da cabeça dele, é muito objetivo. Tem coração muito grande. É um Golias muito grande, cheio de Davis dentro. Se fosse definir o primo, diria: “Ele”. Porque “ele” vale de qualquer um dos lados, é uma palavra inteira, e JLML, segundo ela, é “inteiro”, “não se divide”.// Uma curiosidade: ela diz que ele é a pessoa menos política que ela conhece.// JLML lê muito e, como todos os Lins, não fala língua nenhuma. Para compensar, manda traduzir livros.// Prefere escutar  do que  falar. A conversa é feita de interrogações verdadeiras. “Ele pergunta  porque tem curiosidade mesmo, ele quer saber.”// Foi JLML quem descobriu a vocação de Armínio Fraga, a pedido do médico Sílvio Fraga. Sílvio disse a JLML: “O Armínio quer fazer medicina, mas eu acho que não é esse o caminho.” JLML convidou Armínio para almoçar e, depois do almoço, ligou para o pai aflito com a notícia: “Seu filho é economista.”// Ele ajudou e ajuda muita gente, dá conforto a muitas pessoas, mas paga um imposto alto por isso (como todo mundo bem sucedido): a inveja dos outros.// Ela considera interessantíssimo o fato de JLML não saber nadar e nunca ter conseguido superar esta dificuldade. “Não combina nada com o poder que ele tem de conseguir o que quer.” Por que o trauma de nadar? JLML teria contado a ela o motivo, mas ela se esqueceu.